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O I Salão Nacional do Jornalista Escritor, encerrado no domingo, 17 de novembro de 2007, no Memorial da América Latina, já é um marco na trajetória do jornalismo brasileiro. Essa é a constatação a que chegou o escritor Moacir Scliar, ao final do quarto dia de conferências, entrevistas e bate-papo com o público no Auditório Simón Bolívar. O escritor gaúcho, aliás, foi freqüentador assíduo das jornadas de discussão. “Vocês estão participando de um evento histórico do jornalismo brasileiro”, disse Scliar na abertura da sua exposição, no sábado, 16, “pois dificilmente se reúne tantos personagens como aqui, que protagonizaram alguns dos episódios mais importantes da nossa história nas últimas décadas”.
Scliar, que também é colunista de jornal, disse isso para uma platéia cuja primeira fileira tinha gente como Audálio Dantas, organizador do evento, Zuenir Ventura, Ziraldo, Mauro Santayana, Flávio Tavares, entre outros jornalistas que tiveram um papel importante na contestação à ditadura militar. Como comentou o jornalista e agora romancista Moacir Japiassu, falar para colegas de tal gabarito só faz aumentar a responsabilidade de quem ocupa o microfone. Melhor para o público, que ouviu não só considerações sobre a fronteira entre o jornalismo e a literatura, mas vivenciou o testemunho de vida e esperança de gente como Luis Fernando Veríssimo, Mino Carta, Fernando Meirelles, Ruy Castro, Alberto Dines, entre tantos outros.
A importância do I Salão Nacional do Jornalista Escritor só fará crescer, isso porque Audálio Dantas, diante da riqueza dos depoimentos e debates, agora quer publicar um livro – cujo título provisórios é “Conversas do Salão” – com esse conteúdo. Parceiros para essa empreitada a Associação Brasileira de Imprensa não deve ter dificuldades de encontrar. Público leitor “Conservas do Salão” certamente o terá: basta dizer que vieram participar do salão delegações de cidades do interior de São Paulo, do Mato Grosso, Minas Gerais, Paraná e Santa Catarina. Eram estudantes de jornalismos sedentos por sorver a experiência jornalística alheia, para eles apenas vivida como sonho, por enquanto.
Estarão no livro de Audálio Dantas os depoimentos sinceros de Juca Kfouri sobre a frustrada greve de jornalistas de 1979, detalhes narrados por Flávio Tavares da primeira refeição (picante, literalmente) em liberdade, na cidade do México, dos 15 militantes trocados pelo embaixador americano Charles Elbrick, seqüestrado em 1969, a análise militante da política internacional do francês Ignácio Ramonet, diretor do Le Monde Diplomatique, o testemunho algo melancólico e pessimista, mas sempre lúcido e inteligente, de Carlos Heitor Cony, a vibração de José Hamilton Ribeiro e Ignácio de Loyola Brandão com a revista Realidade, a dura crítica de Eric Nepomuceno… Acima de tudo, “Conversas do Salão” deixará evidente seu tema: o jornalismo de combate existe como missão e é esse o que devemos praticar.
O I Salão do Jornalista Escritor foi a largada das comemorações dos 100 anos da Associação Brasileira de Imprensa, que será completado em abril de 2008. Foi um sucesso de público. Ao todo, 13.500 pessoas assistiram as atividades, que se dividiram em 7 palestras/debates e 11 entrevistas. Participaram 29 jornalistas, sendo 8 mediadores. Completaram o evento duas exposições (uma fotográfica sobre a história da ABI e outra de um dos maiores artistas gráficos brasileiros, Elifas Andreatto) e duas livrarias montadas no foyer do Auditório.
Uma atração à parte foi o Salãozinho, destinado ao público infanto-juvenil. Em uma aconchegante tenda montada na frente do auditório (com ventilação própria, que deixava a temperatura sempre fresquinha), contadores de história se revezaram com as crianças. Elas também podiam fazer oficina de manga ou atividades plásticas. Destaque para o “teatro play back”, que dramatiza histórias contadas na hora pelo público, para Valdeck de Garanhuns, e para os contadores de histórias de Monteiro Lobato. Ziraldo, após palestrar no lado adulto do evento, onde disse que “os maiores personagens femininos da história da literatura brasileira são Capitu, Emília e a Rebordosa (do Angeli)”, correu para o Salãozinho. Ali o esperava uma fila enorme de adultos e crianças para um autógrafo e dedicatória.
Mas não somente jovens participaram do salão. Profissionais experientes, de todas as idades, como Alex Solnic e Geraldina Massi (96 anos) também estavam lá. Para alguns homens e mulheres da imprensa, participar do I Salão Nacional do Jornalista Escritor, organizado com ousadia em pleno feriado da proclamação da República, significou algo parecido à peregrinação à Meca que todo mulçumano tem que fazer pelo menos uma vez na vida. O fiel podia estar meio fraco na fé, cambaleante em suas convicções, que, uma vez na cidade sagrada volta a crer com ardor. Igualmente, o jornalista, após assistir o I Salão Nacional do Jornalista Escritor, recuperou suas convicções iniciais e as dimensões de sua responsabilidade social – afinal, por meio das palavras, desde que mantenha o compromisso com a independência e o espírito crítico, o jornalista pode, por que não?, melhorar a realidade.
Fotos: Fábio Pagan