
“Vamos realizar um cinema como a mesma liberdade que um escritor ou pintor realiza sua obra, sem modelos e sem auto-censura”, disse Fernando Solanas durante a aula magna ministrada no Memorial da América Latina, dia 12 de julho, que fechou o ciclo de debates do 3º Festlatino. O cineasta de 73 anos falou por mais de uma hora de forma pausada, com as idéias muito claras de sua trajetória como cineasta e da história do seu país nos últimos 60 anos.
A platéia estava lotada, cheia de jovens e interessados em aprender mais com o mestre do cinema engajado. Solanas iniciou seu discurso lembrando que suas produções estão intimamente ligadas às suas experiências pessoais: “meus filmes retratam a história política de meu país e da América Latina que vivi”. Das primeiras obras panfletárias, nos anos 60 e 70, ele passou a cantar o exílio nos anos 80 até, após o atentado de que foi vítima em 1991, voltar a retratar a história do seu país, do período Menem até hoje.
Quando jovem, Solanas estudou música – queria ser pianista – mas logo percebeu que só por meio do cinema poderia unir suas paixões: música, teatro e artes plásticas. Solanas se preparou seriamente para iniciar uma carreira cinematográfica bem sucedida. Estudou em conservatório, escola de teatro, trabalhou como roteirista de quadrinhos e, principalmente, tornou-se publicitário – fez 400 filmes publicitário.
Quando estava pronto para começar a filmar seus longas de ficção, eis que a realidade falou mais alto. O diretor argentino traçou um breve panorama sobre os acontecimentos de seu país, sempre relacionando com seus trabalhos: “os anos 60 foram um momento histórico fantástico, em 59 triunfa a Revolução Cubana, reafirmando os ideais de liberdade e ruptura. Apesar da ditadura, tínhamos muita vontade de produzir um cinema inovador, se não pudéssemos exibi-lo ao menos se transformaria em um testemunho histórico daquele momento”.
Solanas conta que a maior dificuldade foi buscar meios para realizar um cinema novo, livre dos moldes importados: “desprender-se dos modelos do passado foi um esforço muito grande, talvez o maior de todos. A herança cultural colonialista não estimula a busca de nossos próprios caminhos, temos que deixar a teia da aranha que nos impede de andar”.
O diretor lembra que o impulso para produzir seu primeiro filme, “A hora dos fornos”, foi a necessidade de desvendar a verdadeira história da Argentina: “me ensinaram na escola uma história que era falsa enquanto a outra estava escondida pela ditadura”. O resultado é um incrível libelo em formato não comercial (4h15 minutos de duração) contra a oligarquia de seu país e o imperialismo. Que cinema iria exibir um filme desses? Solanas fez 60 cópias e as distribuiu em sindicatos, universidades e outras instituições populares.
Em pleno 1968, “A hora dos fornos” explodiu em seu país (visto por mais de 300 mil pessoas). Tornou-se vetor de conscientização e dos movimentos revolucionários que agitavam o mundo todo na época. Com o golpe militar de 1976, Solanas teve que deixar a Argentina. Seu cinema tornou-se mais lírico e onírico, evocando as raízes culturais de seu país, como o tango.
Por Gabriela Mainardi e Eduardo Rascov
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Fotos: Fábio Pagan