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Memorial da América Latina, 12 de julho, por volta das 20h. Luzes vermelhas realçam as curvas do Auditório Simón Bolívar. Produtoras com cabelos e crachás esvoaçantes correm com seus inseparáveis walk-talkies para acertar últimos detalhes. Sacos de gelo garantem a temperatura certa de cervejas e refrigerantes, enquanto garçons descansam as pernas para o árduo trabalho de logo mais. Manobristas comentam a final da Copa a espera do próximo convidado. Aos poucos, um burburinho animado, solenemente vigiado pela Pomba do escultor Alfredo Ceschiatti, começa a agitar o foyer. Cinéfilo que se preze, já conhece o roteiro, está pra começar mais um Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo.
À primeira vista, o enredo parece repetido; um caos na busca por lugar que logo se assenta numa gostosa expectativa; o falatório de praxe que, tanto por sua sincera desordem, como por seus honestos discursos, traçam caminhos a percorrer; os aplausos para a apresentação de cada novo convidado. Sim, é sempre igual, mas a cada ano, diferente e melhor. Seja pelo número recorde de convidados, pontuados na fala do presidente do Memorial, Fernando Leça; seja pela dupla homenagem que, segundo Francisco César Filho, um dos curadores do Festlatino, surgiu para resolver um dilema de todo ano: “quem homenagear?“. A partir desta edição, sempre dois diretores serão homenageados, um brasileiro e um latino-americano, e a lista é enorme, garante Chiquinho.
Coube ao Secretário de Relações Institucionais, Almino Alfonso, fechar as falas; e ele o fez com um discurso síntese dos propósitos do festival. Relacionando a promoção de culturas do continente por meio de suas cinematografias, ressaltou a importância do Memorial na construção da idéia de integração latinoamericana. Se o norte do Festlatino é divulgar e discutir a singularidade estética da cinematografia na América Latina, é compromisso do Memorial promover eventos como este, que vão de encontro ao projeto de Darcy Ribeiro e Oscar Niemeyer.
Ao fim, Paz Fábrega, diretora de “Água Fria do Mar“, filme escolhido para abrir o Festlatino, falou de sua expectativa. “Estou muito curiosa e realmente não sei o que vocês vão achar do meu filme“, confessou. Jovem (aparenta bem menos do que os seus 31 anos) e tranqüila (faz jus ao nome), Paz deu uma rápida entrevista ao Diário do Festival, momentos antes de ser chamada ao palco. (Em tempo, seu filme passa novamente no dia 17 de julho, às 19 horas no Cinesesc).
Como é para você o seu filme abrir o Festlatino?
É muito emocionante para mim meu filme abrir o Festlatino de São Paulo. Creio que não havia pensado. Até agora não havia me dado conta – sim, troquei e-mails, autorizei a exibição e aceitei o convite de vir até aqui – do que isso significava, chegar aqui e ver tanta gente em um lugar tão lindo. Me emociona muito porque a gente sabe que a abertura é como uma festa, então é muito bonito saber que faço parte dela.
É seu primeiro filme?
Sim.
E como é fazer cinema em seu país?
Por um lado é difícil, porque não há muita gente que faça cinema, não é verdade? É muito difícil com quem trabalhar. Por outro lado, é muito bonito porque há muitas coisas para filmar. É como se estivesse virgem, ainda. Há muita coisa que ver. E a gente normal quer participar dos filmes, quer contar histórias. E a gente encontra pessoas muito talentosas… Talvez porque não tem cinema, não tem muito teatro… Entre as pessoas “normais”, às vezes, a gente encontra atores fabulosos que nunca puderam ser atores, porque não tem muito trabalho em meu país. Talvez por isso me deparei com tantos talentos.
Tem escola de cinema na Costa Rica?
Não tinha até recentemente. E a que abriu – uma escola privada – é muito ruim. E o que é o pior, seus formandos ficam frustrados, pois não têm onde trabalhar.
Em seu filme, todos os atores são “gente normal”, quer dizer, “não-atores”?
Sim, trabalhei com gente “normal”. Gosto muito de trabalhar com gente que não é ator de cinema.
Não tem vícios, não tem maneirismos…
Sim, além do que entendo melhor a lógica deles, o que querem mudar… Às vezes com o pessoal de cinema é mais difícil, inclusive os técnicos, não entendo o que querem…
por Adriano Capelo e Eduardo Rascov
fotos: Marcos Finotti e Daniela Agostini (de Paz Fábrega)