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Saiba tudo o que aconteceu na maior mostra de cinema latino-americano que já aconteceu em São Paulo em todos os tempos
O 1º Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo terminou ontem com a projeção de 2 filmes emblemáticos da cinematografia latino-americana. O primeiro – “La Hora de Los Hornos” (A Hora dos Fornos), de 1968 – é um vigoroso libelo revolucionário contra os poderes estabelecidos não só na Argentina, como em toda a América Latina. A obra do então jovem realizador Fernando Solanas dura nada menos que 264 min. A sala 2 do Auditório Simón Bolívar recebeu 500 pessoas, metade dos quais resistiu até o fim. O filme é um clássico da luta política por meio do audiovisual.
A sessão foi aberta pelo ator José Wilker, que atualmente exerce o cargo de presidente da Riofilme. Rapidamente, ele revelou o encantamento pelo qual foi tomado quando viu “La Hora de Los Hornos” pela primeira vez, na Argentina, nos anos 70. Crítico e apresentador de programas sobre cinema (e antes de tudo, cinéfilo de carteirinha), Wilker fez questão de colaborar nos outros eventos de encerramento do Festival, como apresentar o lançamento do livro “Eisenstein e a Pintura Mural Mexicana”, do mexicano Eduardo de La Vega Alfaro.
O segundo filme – “25 Watts” (2001), de Juan Pablo Rebella e Pablo Stoll, projetado às 22h na sala 1 – foi também uma homenagem a Rebella, que se suicidou recentemente. A obra trata de desventuras amorosas e dilemas existenciais enfrentados por jovens de classe média baixa de Montevidéu (foto no alto da página), expondo suas vidas vazias e sem perspectivas econômicas ou políticas. Outros tempos, outras leituras. Evidentemente “25 Watts” é um filme de baixo orçamento. Ele se destaca principalmente pelas inventivas soluções encontradas pelos autores. O desaparecimento prematuro da criatividade de Rebella (32 anos) deixa um buraco no cinema latino-americano e uruguaio em particular.
Juventude
Em um cenário marcado pela hegemonia do cinema hollywoodiano, o 1º Festival Latino-Americano de Cinema de São Paulo apareceu como uma alternativa para que as pessoas que estivessem em São Paulo de 10 a 16 de julho (re)conhecessem o cinema de seu país e dos vizinhos. Com um público de 16.517 pessoas, nas cinco salas em que foram exibidos, o cinema latino-americano mostrou que tem apelo de público.
Realizado pelo Memorial e a Secretaria de Estado da Cultura, com o apoio do Ministério da Cultura e parceria do Sesc-SP e da Cinemateca, o Festival reuniu um público bastante diversificado. Ao contrário do que muitos podem pensar, o festival não se restringiu a um grupo de saudosos dos anos 60, época em que os ‘cinemas novos’ latino-americanos ganharam dimensão mundial. As salas, de debates (foto ao lado) e de cinemas, estiveram repletas de jovens. “A maior medida do sucesso do festival foi ele ser forte entre os jovens”, avaliou Felipe Macedo (foto abaixo), diretor do Festival, responsável por sua concepção.
Para o presidente do Memorial, Fernando Leça, este talvez tenha sido o ponto mais positivo do festival. “Ver os jovens tão interessados e atentos, participando dos debates, das oficinas e assistindo às sessões foi muito gratificante”, disse. “O Festival já é um marco. E isso foi destacado pelos próprios participantes, como Fernando Birri, Edmundo Aray, Nelson Pereira dos Santos, além da mídia, que fez uma ótima cobertura.”
Tendo por objetivo discutir a singularidade estética da cinematografia latino-americana, o festival promoveu, além das projeções, oficinas, encontros e debates – que, entre outros temas, abordaram o documentário na América Latina, a nova ficção latino-americana e a retomada do movimento cineclubista. O resultado das oficinas pôde ser conhecido pelo público no encerramento.
“O que caracteriza o cinema latino-americano é a diversidade e a sua espontaneidade”, disse o cineasta argentino Pablo Trapero, na mesa de debates em que participou com outros cineastas. Nelson Pereira dos Santos, Orlando Senna, Marcelo Piñeyro, Juan Carlos Cremata Malberti, Edmundo Aray, Carlos Getino e Santiago Loza foram alguns dos cineastas que falaram ao público.
Passado, presente e futuro
Outro ponto alto do festival foi a homenagem aos 20 anos da Escola de Cinema e TV de San Antonio de Los Baños, em Cuba. Resultado de um esforço conjunto de cineastas de toda a América Latina, hoje a escola é um espaço de formação para 4,4 mil estudantes de 45 países. O festival exibiu 22 curtas-metragens realizados pelos alunos da escola, que se intitulam “militantes da imagem”.
Criador da Escola de Cinema de Cuba, o cineasta argentino Fernando Birri (foto ao lado) trouxe para o festival sua última produção, “ZA 2005, o Velho e o Novo”, que traz imagens de filmes da década de 1960 comparados com trabalhos dos alunos. Birri é considerado o pai do cinema novo latino, com o lançamento do documentário “Tire Dié”, de 1959, que retrata crianças que viviam de esmolas em Santa Fé, na Argentina.
Para quem gostou do Festival, o presidente do Memorial dá uma boa notícia: as negociações já estão em andamento para que, no ano que vem, seja realizada a segunda edição do Festival, que deve ser ampliado. Vale lembrar que em seguida (25 a 30 de julho) a instituição sediará o Anima Mundi nos mesmos espaços de exibição do Festival. E, em outubro, as cerimônias e projeções de abertura e encerramento da Mostra Internacional de Cinema de São Paulo serão novamente no Simón Bolívar.
Com isso tudo, a Fundação Memorial da América Latina firma-se com um importante centro de apoio e fomento à cinematografia brasileira e latino-americana. Como lembrou Fernando Leça (na foto, ao lado de Birri), o festival valorizou a missão do Memorial da América Latina de integrar os países do continente por meio da cultura. Que venha o próximo.
Fotos: Adriano Capelo, Eduardo Rascov, Fernando Yamamoto, Marcos Finotti e Paloma Varón.
Saiba como o site do Memorial cobriu o 1º Festival de Cinema Latino-Americano