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A influência francesa na arte e na cultura brasileira é significativa. Em especial a partir de 1816, com a chegada de um grupo de técnicos e artistas de diferentes áreas que se estabeleceu no Brasil (posteriormente este grupo ficou conhecido como Missão Francesa). No Rio de Janeiro, onde se instalaram, idealizaram a Escola Real das Ciências, Artes e Ofícios (foto do prédio ao lado), uma escola que enfatizava o ensino do estilo neo-clássico, referencial para o entendimento e a praxis da arte realizada no Brasil daquele período.
Aqui os integrantes da Missão Francesa, a pedido de Dom João VI, executaram projetos arquitetônicos, escultóricos, pinturas e objetos de arte decorativa. Além da produção plástica divulgaram idéias e ideais da cultura francesa, cultuados pela maioria dos artistas brasileiros até a primeira metade do século XX, período em que o gosto e os valores estéticos franceses fundamentaram vários aspectos da vida brasileira: filosofia, gastronomia, moda, decoração e, em especial as artes visuais.
Além do ensino exemplar recebido na Real Academia (posteriormente denominada Escola Nacional de Belas Artes do Rio de Janeiro), um número considerável de artistas completou, com recursos próprios ou como bolsistas do governo brasileiro, a sua formação técnica-estética na própria França. A maior parte destas bolsas foi outorgada por Dom Pedro II, pelos governantes das antigas províncias de várias regiões do país e no século XX pelo próprio governo francês.
No século XX as bolsas oficiais foram substituídas pelo Prêmio Viagem ao Estrangeiro instituídas pelo Salão Nacional de Belas Artes e posteriormente pelo Salão Nacional de Arte Moderna do Rio de Janeiro. No final do século XIX e primeiras décadas do século XX, Paris se transformou na capital cultural da humanidade. Atraídos pela efervescência da vida parisiense, artistas de todos os continentes para lá se dirigiram. Até Vincent Van Gogh passou por Paris.
Desligando-se gradualmente de valores acadêmicos perpetrados pelo rígido ensino artístico daquela época, alguns artistas brasileiros ficaram, de imediato, entusiasmados com as pinceladas soltas e os tons claros dos impressionistas, com as composições arrojadas e os projetos para cartazes de Toulouse Lautrec.
Apesar de agraciados como bolsistas pelos seus méritos e habilidades acadêmicas, voltaram para o Brasil esteticamente transformados, inebriados pela vivência de uma experiência artística diferenciada, inovadora (nem todos…) que influenciaria não apenas a sua própria obra, mas a arte brasileira da primeira metade do século XX.
Paris acolheu (nas duas últimas décadas do século XIX e nas três primeiras do século XX) um número notável de artistas norte-americanos, asiáticos, africanos, europeus e latino-americanos que lá desenvolveram suas carreiras, influenciaram e foram influenciados pela École de Paris. Para Rosemary Lambert, a Escola de Paris nomeia um grupo numeroso de pintores e escultores, alguns franceses e outros de diversas nacionalidades, que desde o começo do século XX até a década de 30 lá viveram e desenvolveram a sua produção plástica, mas segundo outros autores a École de Paris perdura até a década de 40. Para esta historiadora: “Algumas obras da École de Paris parecem hoje muito familiares, porque são frequentemente reproduzidas”.
Sob o termo genérico de Escola de Paris aplicados aos movimentos da arte moderna – fauvismo, cubismo, surrealismo, abstracionismo – documenta-se a intensa concentração de atividades artísticas apoiadas por marchands, críticos de arte e connoisseurs, que fez de Paris o centro mundial da arte avançada ao longo das primeiras décadas do século passado.
Já Frank McEwen, no catálogo da exposição École de Paris organizada em 1951, pela Royal Academy of Arts de Londres, afirmou que: “Paris tinha naquela época 130 galerias de arte, enquanto nenhuma outra capital passava de 30 e que foram expostas na cidade de Paris obras de um número incalculável de artistas, do qual um terço eram estrangeiros”. O mesmo autor complementa que “depois da Segunda Guerra Mundial, Nova York tomou o lugar de Paris de capital mundial de arte de vanguarda.”
Neste cenário parisiense despontaram vários artistas brasileiros. Alguns foram citados entre os da École de Paris: Antonio Bandeira, Cícero Dias, Vicente do Rego Monteiro e Victor Brecheret, por isso foram incluídos em exposições representativas desta École: influenciaram e foram influenciados pela França. Dos artistas brasileiros que estudaram ou residiram, a partir do final do século XIX na França destacamos: Almeida Junior, Eliseu Visconti, Pedro Américo, Batista da Costa, Antonio Parreiras, Belmiro de Ameida, Oscar Pereira da Silva, Lucílio de Albuquerque, Benedito Calixto, Rosalvo Ribeiro, Décio Villares, Gastão Worms, Dario Barbosa, Campos Aires, Mario Barbosa, Túlio Mugnaini, Victor Brecheret, Tarsila do Amaral, Carlos Oswald, Cândido Portinari, Emiliano Di Cavalcanti, Noêmia Mourão, Antonio Gomide, Celso Antonio, Anita Malfatti, Ismael Nery, Samson Flexor, Antonio Bandeira, Clóvis Graciano e Cícero Dias.
Nos anos 50, apesar da França não ser mais o foco principal das vanguardas, muitos artistas brasileiros ainda optaram por Paris para aperfeiçoar e ou vivenciar a arte. A magia parisiense prevaleceu. Por isso Lygia Clark, Antonio Dias, Mário Gruber, Milton da Costa, Sérgio Camargo, Sérvulo Esmeraldo, Anna Letycia Quadros, Lívio Abramo, Arthur Barrio, Milton da Costa, Maria Leontina, Sérgio Ferro, Sonia Ebling, Inimá de Paula, Flavio-Shiró, Arthur Luiz Piza, Carlos Scliar, Eduardo Sued, Yoshiya Takaoka, Jorge Mori e entre tantos outros Antonio Carelli lá residiram, estudaram, constituíram família e ou produziram suas obras. A passagem destes artistas pela França marcou significativamente a produção plástica dos mesmos. Cícero Dias ficou em Paris até o fim de sua vida, Arthur Luiz Piza e Flávio-Shiro lá residem há décadas…
Alguns artistas brasileiros não apenas residiram, estudaram ou se aperfeiçoaram na França, mas participaram da vida cultural parisiense, onde, inclusive foram amigos e ou conviveram com importantes artistas: Pablo Picasso, Frank Kupka, Fernand Leger, Torres Garcia, George Rouault, Jacques Villon, Albert Gleizes, Juan Miró, André Masson, Max Ernest, Francis Picabia, Victor Vasarely, Hans Hartung, André Lhote, Henri Laurens, Gino Severini, Jesus Soto, Pierre Soulages. Estes contatos amistosos foram fundamentais para a efetiva consolidação de uma idéia, que parecia inalcançável para a época: a criação da Bienal Internacional de São Paulo. Vários artistas foram pessoalmente convidados e ou indicados por Emiliano Di Cavalcanti, Cícero Dias, Vicente do Rego Monteiro, Antonio Bandeira, Tarsila do Amaral e Victor Brecheret que ressaltaram o significado da instalação de uma exposição internacional, nos moldes da Bienal de Veneza, nos Trópicos… Até hoje um marco significativo, não apenas para as artes visuais do Brasil, mas para a própria América Latina.