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São Paulo, 26 de maio de 2011.
Ele veio de pequenas ilhas da costa da África. Um país de lindas praias cuja população total não chega a 170 mil pessoas, incluindo a diáspora. A vocação turística da nação é evidente, mas a renda gerada nesse campo é insuficiente para o bem estar da população. O cacau hoje produzido em suas terras não chega a um terço do que se colhia nos tempos da colonização. Como em grandes partes do continente, São Tomé e Príncipe é um país carente.
“De alguma maneira, ainda permanecemos escravos”, diz Eduardo Malé, artista plástico de São Tomé e Príncipe que participa da mostra Arte Lusófona Contemporânea. Vindo de Portugal, ele chegou nessa quarta, 25 de maio, e no dia seguinte, fez uma performance na abertura da exposição. “O continente está como que amarrado, não consegue se mexer, sair da condição de lugar de pobreza”, continua Malé. Ele concorda que a África é o continente esquecido, mas não deixa de fazer uma auto-crítica: “Nós mesmos não conseguimos resolver nossos problemas sozinhos. Temos que recorrer aos outros. No ano passado, por exemplo, para fechar as contas, o país teve que pedir ajuda a Dubai”.
Eduardo Malé tem 37 anos, é formado em Artes e atualmente faz um mestrado em Portugal. Mas é a condição empobrecida e manietada da sua terra natal que o preocupa e está presente em seu trabalho, naturalmente. No Brasil, ele recria uma escultura que atualmente está exposta em uma galeria de Barcelona, Espanha. Trata-se de uma estrutura feita em arame na forma de um homem de braços abertos. Durante a performance ela é coberta por tiras de fibras de caule de banana. O artista chegou a São Paulo com uma mala na mão desse material orgânico vindo diretamente da África. “É impressionante como o Eduardo Malé trabalha o arame, conseguindo assim de cabeça fazer a forma humana com extrema precisão”, comenta Ângela Barbour, gerente da Galeria Marta Traba.
Sua escultura em arame remete aos esboços renascentistas do corpo humano. “As pessoas sempre procuram uma referência ao ver uma obra de arte”, diz Eduardo, “até mesmo nos trabalhos não figurativos ou abstratos”. Por exemplo, inspirado em ninhos de passarinhos da sua terra, “que me fascinavam na infância, em África”, Malé construiu imensas estruturas em forma de ninho, sempre misturando metal e material orgânico. “As pessoas associavam às mais diferentes coisas, o que me espantava”, diz.
Após revesti-la completamente com fibra de bananeira, será untada com cola, depois cera e finalmente verniz, para o material orgânico não ser consumido pór microorganismos.A escultura que Malé constrói no Memorial chama-se “Retenção”. O homem está de braços abertos, “retido” por suas circunstâncias históricas e por sua própria incapacidade. “Mas as pessoas acham que é a figura do Cristo, o que posso fazer…”
Fotos: Daniela Agostini