
El sol y la muerte
El sol y la muerte
Como el ciego que llora contra un sol implacable,
me obstino en ver la luz por mis ojos vacíos,
quemados para siempre.
¿De qué me sirve el rayo
que escribe por mi mano? ¿De qué el fuego,
si he perdido mis ojos?
¿De qué me sirve el mundo?
Os versos acima foram publicados em 1948, no livro “La Miseria del Hombre”, assinado por um filho do lindo, áspero e frio sul chileno. Aos 31 anos, Gonzalo Rojas despontava já um poeta maduro, cuja poesia reverberava a obra revolucionária do peruano Cesar Vallejo (1892-1938), talvez o maior nome da vanguarda latino-americana na primeira metade o século XX. Ambos viveram na Europa por algum tempo e respiraram do ar libertário dos tempos.
Un aire, un aire, un aire,
un aire,
un aire nuevo:
no para respirarlo
sino para vivirlo.
(“La Palabra” in Contra la muerte, 1964)
Segundo o literato chileno José Emilio Pacheco, a poesia de Gonzalo Rojas revela uma rigorosa e elaborada consciência “autotextual” , com o cruzamento de múltiplas modalidades discursivas e o diálogo com autores chaves do modernismo europeu e latino-americano. Inevitavelmente, ele bebeu da rica tradição literária de seu país e da língua castelhana, especialmente do “Século de Ouro” espanhol.
Há autores que “prisioneiros de seus sentimentos, cantaram um só canto durante toda sua vida” (frase de Karl Vossler a propósito de Hölderlin e Leopardi). O mesmo pode-se dizer de Gonzalo Rojas, segundo o crítico Marcelo Coddou. “A estrutura fundamental de sua obra parece fundar-se em uma oposição chave: vida e morte”. O objeto do “pensamento poético” do Gonzalo Rojas, explica Coddou, é “o homem e seu destino, o homem e sua miséria”. Encontra-se em sua obra uma preocupação “agônica pela existência humana em todas as suas direções: a angústia do tempo, um sentimento, religioso, do ser vivido em sua aspiração de transcendência”…
A trajetória literária de Gonzalo Rojas levou-o a ganhar o Prêmio Cervantes de 2003. Tornou-se um dos grandes poetas da história cultural da América Latina. Aos 94 anos, Gonzalo Rojas faleceu nesta segunda, 25 de abril de 2011, saciado de dias.
¿De qué me sirve el cuerpo que me obliga a comer,
y a dormir, y a gozar, si todo se reduce
a palpar los placeres en la sombra,
a morder en los pechos y en los labios
las formas de la muerte?
Me parieron dos vientres distintos, fui arrojado
al mundo por dos madres, y en dos fui concebido,
y fue doble el misterio, pero uno solo el fruto
de aquel monstruoso parto.
Hay dos lenguas adentro de mi boca,
hay dos cabezas dentro de mi cráneo:
dos hombres en mi cuerpo sin cesar se devoran,
dos esqueletos luchan por ser una columna.
No tengo otra palabra que mi boca
para hablar de mí mismo,
mi lengua tartamuda
que nombra la mitad de mis visiones
bajo la lucidez
de mi propia tortura, como el ciego que llora
contra un sol implacable.
El sol y la muerte
(continuação)