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Uma das palestras mais esperadas do colóquio “Amazônia Desafios e Perspectivas da Integração Regional” foi a do professor Luciano Coutinho, na tarde da segunda-feira, 16 de novembro. Não era para menos. Como presidente do BNDES – principal órgão financiador da economia brasileira -, ele exerce um papel decisivo na definição dos rumos do desenvolvimento amazônico. E não só brasileiro, como ele explica: “Nos preocupamos com os 15 milhões de habitantes das franjas da Amazônia brasileira, bem como os cerca de 15 milhões de pessoas que moram no bioma amazônico em outros países, que inclui os moradores da Colômbia, Peru, Equador, Bolívia, Venezuela…”
Coutinho, no entanto, ressalva que o BNDES não formula as políticas do governo para a Amazônia, nem para a área energética ou rodoviária, que cabem às instâncias ministeriais. O Banco Nacional de Desenvolvimento, sim, atua no sentido de viabilizar essas políticas públicas.
Diante de uma mesa de especialistas na questão amazônica, como a colombiana Luz Marina Mantilla , do Instituto Amazônico de Investigaciones Científicas, Adalberto Val (INPA, foto abaixo), Carlos Nobre (INPE), Jacob Paulus (Academia Brasileira de Ciências) e Emídio de Oliviera Filho (Capes, foto em pé), Luciano Coutinho primeiro procurou levantar alguns temas cuja reflexão norteia o comportamento do órgão que dirige.
A questão, muito complexa, pode ser simplificada em como montar uma estratégia viável para o desenvolvimento sustentável do grande bioma amazônico, levando em consideração que as atividades predatórias (extrativismo ilegal de madeiras, mineração selvagem, plantação de soja, pecuária etc) são mais atraentes para a população local pois rendem mais.
Luciano contou que esteve recentemente com o economista americano Joseph Stiglitz, prêmio Nobel de economia de 2001 e um dos críticos mais lúcidos do neoliberalismo, e ouviu dele que será o mercado de carbono a ser construído que irá resolver essa assimetria. O presidente do BNDES disse que será bem vindo esse mecanismo de compensação pelo qual os países pobres emitem títulos correspondentes ao que deixam de poluir (que por sua vez seriam comprados pelos países ricos poluidores, gerando uma bolsa de valores verde). “Mas ele é insuficiente. É preciso que o Estado atue com a sua capacidade de influenciar e orientar o desenvolvimento no sentido de estimular a transação da economia predatória para a sustentável”.
Segundo Luciano Coutinho, o BNDES tem compromisso com a economia solidária e sustentável, por meio de várias linhas de crédito. Como desenvolver novas atividades sustentáveis que tenham a ver com os modelos de vida e produção da população local e que consigam rentabilidade maior do que a atual? Como construir um modelo de produção familiar integrada à tecnologia sustentável?
Para Luciano Coutinho, o Fundo da Amazônia criado por lei federal em meados do ano passado está se constituindo no grande agende equacionador das questões amazônicas. “Ao contrário do BNDES, que apenas empesta dinheiro, o Fundo Amazônico tem dinheiro a fundo perdido que pode ser empregado em projetos de preservação e de economia solidária”, diz. Constituído por várias entidades da sociedade brasileira, o Fundo da Amazônia é coordenado pelo Ministro do Meio Ambiente e tem a sua verba gerida pelo BNDES. Ou seja, “o BNDES é apenas o executor da política discutida no âmbito do Fundo da Amazônia”.
Coutinho reconhece que tem projetos que pleiteiam se concretizar na região amazônica que precisam ser analisados com muita cautela. “Nos estamos do lado dos que pedem para ir devagar com os projetos rodoviários, por exemplo, sob pena de podermos fornecer justamente a infraestrutura que falta para completar a devastação”, complementa. “A região tem a vocação de usar a hidrovia, que é mais eficiente, barato e adequada à região”.
O presidente do BNDES reconhece que existe pouca integração entre os nove países amazônicos. “Agora é que aparecem os primeiros projetos de integração da área amazônica. Há, por exemplo, um projeto rodoviário de ligação do Acre com o Peru que já passou por todos os requisitos ambientais. Existem outros projetos de integração com o Equador e a Colômbia, que ainda estão numa etapa de análise. Há também alguns projetos de integração energética. O relevante é que esses projetos obedeçam políticas que levem em consideração os regulamentos ambientais brasileiros”, conclui.
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Ciência, Tecnologia e Inovação na Região Amazônica
O segundo dia de debates teve como destaque um palestrante ausente. O jornalista e renomado especialista em Amazônia, Lúcio Flávio Pinto, não pode comparecer e mandou sua mensagem em vídeo. Sua exposição contagiou os participantes do seminário pela escancarada franqueza nacionalista com que Lúcio Flávio defende os interesses da região amazônica. E que, por causa disso, tem lhe custado dezenas de processos judiciais – razão que o impediu de sair de Belém do Pará.
A mesa 3, de que o jornalista paraense participou, tinha como tema a Ciência, Tecnologia e Inovação como Motores de um novo modelo de desenvolvimento para a Amazônia. Sempre em tom crítico, listou as pendências responsáveis pela falta de políticas e estratégias que impulsionem definitivamente a Amazônia para a realidade tecnológica, fazendo uma analogia com o que a professora Bertha Becker dissera na véspera.
Além de Lúcio Flávio, também abordaram a questão o professor Fábio Scarano, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, o secretário de desenvolvimento, ciência e tecnologia do Pará, Maurílio Monteiro e Roberto Waack, da Amata S.A. À tarde, o tema da última mesa abordou os Arranjos Multilaterais e Dimensões Estratégicas da Integração Sul-Americana.
Depois de Lia Osório Machado (UFRJ, foto ao lado) e Manuel Picasso (Organização do Tratado de Cooperação Amazônica), falou o representante do BID, Mauro Marcondes, que elencou os instrumentos e os projetos da instituição em andamento na região. Afirmou que o BID está apostando em uma agenda nova, “que empurre o conjunto de 12 países para uma mesma direção e um novo formato de atuação na Amazônia”.
Depois, o professor da USP, Wanderley Messias da Costa, fez uma exposição técnica sobre o tema, e elogiou a revista Nossa América, editada pelo Memorial da América Latina que, segundo ele, tem sido parceiro na organização de seminários sobre a Amazônia. Enfatizou o papel das Forças Armadas na região, considerada a de maior vulnerabilidade estratégica da atualidade. Isso, disse ele, tem induzido o governo a adotar iniciativas que adensam a presença das três forças nas áreas de fronteira dos países que compõem a região amazônica.