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O auditório ficou apertado para receber a quantidade de interessados em assistir o último debate do 3º Festival de Cinema Latino-Americano de São Paulo. Os diretores brasileiros Cláudio Assis, Cao Guimarães e Eduardo Coutinho, além do crítico de cinema Cléber Eduardo esquentaram a noite do dia 11 de julho com declarações e relatos de suas experiências pessoais.
O clima de descontração deu o tom. Cláudio Assis, diretor de “Amarelo Manga” e “Baixio das Bestas”, já conhecido no meio pela irreverência, iniciou seu discurso pedindo o cinzeiro: “o que eu não suporto é a hipocrisia, aqui todo mundo fuma, todo mundo bebe, todo mundo trepa!”. E, enquanto baforava seu charuto, fez questão de salientar seu compromisso com a arte: “não produzo nada que não tenha um propósito, meu cinema está plugado com o social, é feito para se entender e não para se vender”.
Diferentemente dos outros dois diretores que têm, aparentemente, uma ligação muito mais nítida com a apreensão do real – ambos produzem documentários e criam suas personagens a partir de recortes de indivíduos feitos de carne e osso –, Assis cria uma ficção para chegar mais perto da ‘realidade’. A representação de ambos os três faz pensar e almeja modificar a realidade representada.
Cao Guimarães, autor de “O Andarilho”, utiliza uma bela metáfora para explicar seu conceito de realidade: “é como a superfície de um lago, você pode observá-la de um barranco, jogar uma pedra ou mergulhar dentro dela”. Tendo como exemplo um de seus filmes, “A alma do osso”, Cao explica que mesmo um trabalho considerado documental passa por um processo de construção e reconstrução que já deturpa a realidade: “Quando me deparei com aquela figura inicial do eremita percebi que era totalmente diferente do meu conceito inicial, ele era um tagarela, não parava de falar, mas no filme, durante os primeiros 50 min mostrei-o completamente em silêncio”.
Eduardo Coutinho, um experiente cineasta de cabelos brancos, autor de “Jogo de Cena” que está no Festival, lembrou dos cuidados necessários ao trabalhar com pessoas de verdade, que serão expostas: “eu sempre digo que documentário não muda a vida de ninguém, o que a gente tenta fazer é que não piore, que depois a pessoa não seja demitida ou fique desmoralizada em sua comunidade”.
O tema sugerido “Realidade: Apreensão e Representação” foi aos poucos se desmembrando e tomando outras formas de acordo com as dúvidas da platéia. Coutinho aproveitou para incentivar os novos trabalhos: “hoje com tanta tecnologia é bem mais fácil começar um projeto, quem tem casa e roupa lavada não precisa de mais nada, faça sem dinheiro, use os finais de semana!”
Ao fim, os três diretores concluíram que cinema utiliza uma linguagem universal, por isso caracterizá-lo como latino-americano é reduzi-lo: “Ninguém escuta falar sobre cinema da União Européia”, brinca Coutinho. Mesmo assim, ressaltam a importância de festivais como esse: “pelo menos uma vez por ano temos a oportunidade de ver um filme venezuelano”.
Por Gabriela Mainardi
Foto: Cláudio Assis, Eduardo Coutinho, Cléber Eduardo e Cao Guimarães.
Crédito: Fábio Pagan