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O sociólogo e jornalista peruano Rafael Roncagliolo ministrou, no dia 9 de outubro, palestra sobre “Processos eleitorais e políticos nos países andinos após o referendo da Bolívia”, na Biblioteca do Memorial. Pai do escritor Santiago Roncagliolo, uma das estrelas emergentes da literatura latino-americana, Rafael concentrou-se nos países andinos do Norte: Bolívia, Peru, Equador, Colômbia e Venezuela.
A mediação foi do Prof. Dr. Enrique Amayo, livre docente e professor de História Econômica e Estudos Internacionais Latino-Americanos da Unesp, com comentários do Prof. Dr. Carlos Romero, catedrático da Cátedra Memorial da América Latina e professor titular da Universidade Central da Venezuela.
Roncagliolo dividiu sua exposição em tópicos, que veremos a seguir.
1 – Redemocratização
Há 44 anos, iniciou-se uma onda de golpes militares na América Latina. Antes do golpe brasileiro, em 1964, houve um pequeno golpe no Peru, que não durou muito. Em 1978, se alguém abrisse o mapa da América Latina, veria um mapa verde e não é pelas florestas, mas pela presença dos militares.
Nesta época, só Costa Rica e México não tinham ditaduras. A primeira, por não ter exército e o segundo não tinha golpe, mas tinha a predominância do PRI. E, na América do Sul, só a Colômbia e a Venezuela não tinham ditaduras nesta época.
“A Colômbia é um dos países mais institucionalizados da América Latina, só teve dois golpes em toda a sua história: um em 1854 e outro em 1954. Pela lógica, o próximo será em 2054”, brincou. Segundo ele, lá se estabeleceu um pacto entre as principais forças políticas e o mesmo teria ocorrido na Venezuela.
Felizmente, de 1978 para cá as democracias vêm se reestabelecendo na região. E hoje, pela primeira vez na história, a América Latina toda tem governos democráticos. Com eleições mais ou menos controversas, é verdade, mas a democracia predomina.
2 – O contexto atual
Nestas três décadas de redemocratização, o que tivemos foi a aprovação do Consenso de Washington e das políticas neo-liberais em toda a região, implicando na demolição do Estado criado nos anos 30 e abrindo espaço para a globalização e o livre mercado.
Por outro lado, a questão dos direitos humanos passou a ser uma questão internacional, deixando de limitar-se aos países onde ocorrem as violações. E a democracia também passou a ser interessante em nível internacional.
3 – Paradoxos
“Nunca tivemos tanta democracia e nunca tivemos tantos descontentes”, disse o sociólogo, referindo-se à incapacidade de todos os países da região de diminuírem a pobreza. “Só o Chile e, mais recentemente o Brasil, apresentaram alguma diminuição, mas nenhum resolveu o nosso maior problema, que é a desigualdade social”, afirmou.
“Nós não somos os mais pobres, mas somos os mais desiguais do mundo”, disse. O que temos visto, em geral, é a incapacidade do Estado de se vincular aos problemas do povo.
4 – Mudanças dos focos problemáticos
Se em 1978-1988 o problema era conseguir sair das ditaduras militares, em 1998-2008, o problema maior é a governabilidade, principalmente nos países andinos.
5 – Especificidades andinas
Na Colômbia, já se contabilizam 200 mil mortos no conflito e pelo menos 60 parlamentares estão indiciados por vinculação com grupos paramilitares. Na Venezuela, tivemos o primeiro caso de um referendo popular para ver se o presidente saía ou ficava.
Na Bolívia, temos um grande conflito étnico e geográfico. O Peru recuperou a democracia em 1980 e, com o Fujimori, retrocedeu. E lá tem também o Sendero Luminoso, grupo terrorista.
Apesar de terem suas diferenças, o sociólogo aponta uma semelhança entre seus atuais governantes. Para ele tanto Hugo Chávez, como Evo Morales, Rafael Correa e Álvaro Uribe têm formas de governo que vão contra os partidos e as instituições. Mesmo o peruano Alan García, que é presidente do seu partido, fala sempre do povo em primeiro lugar. Todos são populistas ao seu ver. E todos eles mudaram a Constituição de seus países para se reeleger.
Sobre o palestrante
Rafael Roncagliolo de Orbegoso, sociólogo e jornalista peruano, exerceu a direção de jornais e programas de rádio e televisão em seu país. Foi presidente da Associação Mundial de Rádios Comunitárias (AMARC), entre 1995 e 1998, e consultor de diversas organizações internacionais de relevância, entre elas o Instituto Interamericano de Direitos Humanos da UNESCO, o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (PNUD) e a Fundação Internacional para Sistemas Eleitorais (IFES).
Como acadêmico, leciona na pós-graduação das universidades de Lima, Católica do Peru e Nacional Mayor de San Marcos, e foi professor visitante das universidades de Québec, Iberoamericana do México e Pontifícia do Equador. Atualmente, dirige o escritório para os Países Andinos da ONG internacional IDEA – Institute for Democracy and Electoral Assistence, tendo se destacado também como secretário geral e membro fundador do Movimento Cívico Transparência do Peru, desde sua criação em 1994 até 2002.