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A cena em que os retirantes criados por Graciliano Ramos sacrificam o papagaio de estimação da família para matar a fome abriu o filme “Za 2005, Lo viejo y lo nuevo”, de Fernando Birri. Na platéia, Nelson Pereira dos Santos se mexeu na cadeira. Quem poderia dizer que as decisões estéticas tomadas por ele décadas atrás no filme “Vidas Secas“ – a luz estourada desabando sobre os caminhantes, a imensidão do nada no meio do sertão, a interpretação naturalista ao máximo, os sons guturais, os grunidos, o quase silêncio dos personagens em uma narração seca, despojada, limpa e essencial – estariam ainda hoje irradiando, influenciando os novos produtores, como mostrou a seqüência do filme “Za 2005”, que reproduziu cenas de um documentário recente produzido em Cuba que trabalha com a mesma luz.
“Estou muito feliz com essa retrospectiva”, disse o cineasta brasileiro, ao mesmo tempo que recebia um abraço do cineasta Reinaldo Volpato, que fez questão de dizer que gostou muito do recente filme de Nelson Pereira dos Santos, “Brasília 18%”, e o defende sempre que pode. Mas Santos está mais interessado no futuro. Ele espera começar a filmar a biografia de Antônio Carlos Jobim já no segundo semestre. “Serão dois documentários, na verdade. O primeiro, um retrato afetivo do compositor, com depoimentos da família e amigos; no segundo, abordarei a parte musical mais propriamente. Com estrutura de uma ópera, será dividida em 3 atos: ´Rio de Janeiro´, `A mulher`e ´Natureza`”, revela.
Abordado pelo mexicano Felipe Erimberg, produtor da TAL (Televisão América Latina), Nelson Pereira ouviu que é surpreendente como o Brasil, país de tão boa música, tem tão poucos filmes musicais. Alheio à discussão, Santos confessou já estar com o fardão preparado. É que na próxima segunda-feira, 17 de julho, ele toma posse de sua cadeira e se torna o mais novo imortal da Academia Brasileira de Letras.
Texto e foto Eduardo Rascov