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Por Eduardo Rascov
O bombeiro Oscar do Carmo foi surpreendido pela explosão e arremessado longe. Levantou-se e tentou sair do recinto tomado por uma fumaça negra espessa e de cheiro insuportável, apesar da máscara contra gases. Ele procurou a rota de fuga mais próxima, mas, na escuridão, se deparou com um beco sem saída. “O oxigênio acabou e desmaiei. Acordei só seis dias depois, numa cama do Hospital das Clínicas”, contou após receber uma homenagem de sua corporação, ontem, 30 de janeiro, na Praça Cívica da Fundação Memorial da América Latina, sob um pungente toque de clarinete da banda da PM. Ao seu lado, o bombeiro Marcelo de Araújo, que padeceu o mesmo sofrimento. Os dois precisaram ser resgatados, inconscientes, por seus companheiros, numa operação arriscada que deixou apreensivo os 245 bombeiros (em 80 viaturas) que combateram o incêndio do Auditório Simón Bolívar, no Memorial, em novembro passado. Foram momentos dramáticos que o Memorial jamais vivera anteriormente.
Também foram homenageados – com o mais alto grau da Láurea de Mérito Pessoal da corporação – outros dois heróis, que se feriram gravemente no interior alto e côncavo do auditório. São eles o cabo Eduardo Roberto de Lima e o soldado PM Rodolfo Pavani. Os quatro representaram os 25 bombeiros que sofreram lesões em diferentes graus tentando debelar o fogo que consumia um dos equipamentos culturais mais importantes da cidade. São heróis anônimos, que se dedicam à causa pública com abnegação, o que caracteriza a história da corporação de bombeiros. Daí vem sua boa reputação. Em pesquisa Ibope feita em agosto do ano passado, ainda no calor das agitações políticas de junho, o Corpo dos Bombeiros foi apontado por 70% dos entrevistados como sendo a instituição pública mais respeitável do país.
A homenagem aos heróis anônimos do Corpo de Bombeiros que arriscaram a vida no Memorial se deu em meio à cerimônia de troca de comando da Corporação. O coronel Erick Hoelz Colla assumiu o cargo no lugar do Cel. Reginaldo Campos Repulho. Para tanto, a PM formou um dispositivo ao lado da “Mão”, com a presença perfilada de representantes de vários setores e especializações do corpo de bombeiros, inclusive dos guarda-vidas. A tropa formada foi passada em revista pelo antigo e novo comandante, com pompa e circunstância, ao som da bandinha.
O novo comandante lembrou que houve no incêndio no Memorial um fenômeno chamado “flashing over com evolução atípica, sem paralelo no Brasil e provavelmente no mundo”. Foi formada uma equipe de pesquisa para entender o que aconteceu e estudar formas de agir com segurança. “Era aterrador acompanhar o que aconteceu com nossos companheiros feridos, não só no dia do incêndio, mas também durante a internação”, confidenciou. O coronel Colla contou que após o sinistro na danceteria de Santa Maria, que ceifou 242 vidas, medidas de segurança foram revisadas, as regras se tornaram mais rígidas e, no caso do Estado de São Paulo, estão on line a lista das casas de eventos que têm a aprovação do Corpo de Bombeiros, após 17 mil vistorias.
Outra novidade saudada pelo novo comandante da corporação é a aquisição de novos equipamentos, como escadas magirus de grande alcance. Uma delas estava exposta no Memorial. O Cel Colla apontou para ela e revelou: “Essa escada recentemente salvou mais de 50 vidas, isoladas pelo fogo e pela fumaça, evitando que se repetisse as cenas trágicas que vimos no edifício Joelma, há 40 anos.”
Fotos: Lautaro Abâ