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São Paulo, 6 de outubro de 2009.
Uma mostra antológica da obra de Maureen Bisilliat pode ser vista na sede do Instituto Moreira Salles do Rio de Janeiro, a partir de hoje. São cerca de 250 fotos clicadas por Maureen nos últimos cinqüenta anos. Em fevereiro, "Fotografias Maureen Bisilliat" vem para São Paulo, e fica até abril, no Centro Cultural da Fiesp, na avenida Paulista. Maureen é a gerente do Pavilhão da Criatividade deste Memorial.
A exposição foi inaugurada para convidados ontem, 7 de outubro, após uma cuidadosa curadoria capitaneada pela própria fotógrafa. “Fazer uma retrospectiva como essa que se quer auto-biográfica é muito perigoso”, dizia ela circulando entre uma imagem e outra, “pode ficar fragmentada”, exagerava, exercitando sua proverbial auto-crítica, como conta sua filha, a documentaris Sophia Bisilliat (foto à esquerda, com a mãe). “Mas a equipe de curadores do Instituto Moreira Salles me ajudou muito”, confessa Maureen, generosa como sempre. A propósito, como você está se sentindo com essa homenagem, Maureen? “Vaga”, foi a resposta.
“A mostra “Fotografias Maureen Bisilliat” é a coroação de um trabalho de 6 anos”, conta Sergio Burgi, coordenador de fotografia do Instituto Moreira Salles. Ele explica que a “preocupação do instituto tem sido formar uma coleção de grandes fotógrafos brasileiros, conservando a obra completa deles. “ Esse é o caso da Maureen. “O trabalho dela foi muito importante para uma geração de fotógrafos brasileiros. Toda a sua produção dos anos 60, 70 e 80, bem como as aulas que deu na In Foto desempenharam um papel importante na produção contemporânea”, resume Burgi.
Prestigiada por artistas, amigos e companheiros de trabalho – como o presidente do Memorial, Fernando Leça, o superintendente executivo do IMS, Flávio Pinheiro, o montador Marcos Albertim, a filha, os netos e o documentarista Lúcio Kodato (fotos acima) – a abertura da exposição contou pelo menos com uma de suas alunas dos anos 70. Trata-se de Lila Martins, que lembra dos tempos que estudava fotografia com Maureen: “Até meu marido, Paulo Egidio Martins (o ex-governador) ganhou um prêmio de fotografia com uma série sobre cavalos, feita por ele para um concurso promovido pelo Masp, estimulado por Maureen que desafiava nossa criatividade”.
Ocupando 5 salas e dois corredores da bela casa na Gávea onde um dia morou a família Moreira Salles (quem assistiu o filme “Santiago” entende do que estou falando), estão lá os ensaios fotográficos que tornaram Maureen notória: o universo de Guimarães Rosa, os índios do Xingu – realizado em estreita colaboração com os irmãos Villas-Boas -, os sertões de Euclides e as caranguejeiras em conversa com o poema de João Cabral de Melo Neto. Outros ensaios presentes são “Cortejo luminoso”, “Boi-bumbá”, “Pele Preta” e “Romeiros” .
Nesses trabalhos, Maureen parte do registro da realidade objetiva para um trabalho autoral que se assemelha à pintura. Joana, responsável pela digitação do Instituto Moreira Salles, conta que a primeira vez que mostrou à Maureena o contato (ampliação com a prova dos negativos), ouviu o seguinte comentário da autora: "Você teve medo. Você tem que queimar mais, ir mais além, trazer preto. Sim, você teve medo".
"Era verdade. O contato é mais para leitura, então pensei em deixá-lo o mais visível possível…", diz Joana. Daí a importância de ter o fotógrafo junto. "Ela foi interferindo o tempo todo. Fazia questão de ter o traço dela. É quase como se ela chegasse na fotografia normal e pintasse ou desenhasse em cima…"
Marcos Albertin, responsável pela montagem da exposição (na foto ao lado ele brinda com Ruth Klotzel, responsável gráfica pelo projeto do livro, e a autora. Acima os netos da Maureen, Júlia e Jacques, que também estão se encaminhando para as artes visuais), ressalta outro aspecto desse trabalho de criação/interpretação de Maureen: "Ela joga conscientemente com o aspecto gráfico da fotografia. Por exemplo, na hora de digitalizar uma imagem em preto e branco, ela pede para zerar as mínimas e subir as máximas…", e dessa maneira ela constrói um sentido novo, por meio do jogo entre trevas e a fonte de luz.
Como contraponto, e para mostrar a amplitude do universo maureeniano, há uma sala dedicada totalmente a suas viagens ao altiplano boliviano, à China e ao Japão. A exposição proporciona ainda ao visitante uma leitura simultânea entre a produção fotográfica e a produção editorial de Maureen Bisilliat ao longo de sua carreira, revelando tanto a fotógrafa como a editora de imagens e textos.
Durante toda a mostra, haverá a projeção de "Xingu/Terra", documentário feito na década de 1980 por Maureen Bisilliat e Lúcio Kodato, rodado na aldeia mehinaku, no Alto do Xingu. No dia 17, Maureen e Kodato fazem uma apresentação comentada de seu filme. Logo em seguida, os presentes terão o privilégio de fazer uma visita guiada pela autora.
O IMS está lançando também uma publicação homônima à exposição, que reconstrói a trajetória de Maureen. O livro, editado pela própria fotógrafa, reúne 12 ensaios fotográficos, dispostos de forma delicada e subjetiva. As imagens são combinadas a textos selecionados por Maureen de João Cabral de Melo Neto, Guimarães Rosa, Jorge Amado, Euclides da Cunha, entre outros.
O livro ainda traz uma biografia de Maureen escrita por Marta Góes, uma reunião das melhores críticas já escritas sobre seu trabalho e uma bibliografia comentada pela autora. Tudo isso ilustrado por imagens de paisagens, pessoas e objetos que a marcaram ao longo da vida. É pois uma fonte de referências inestimável sobre suas publicações, exposições, vídeos e filmes. O livro, por enquanto, pode ser encontrado na lojinha do Instituto Moreira Salles do Rio de Janeiro. Mas em breve estará nas livrarias de todo o país.
Por Eduardo Rascov
Fotos da inauguração de Cristina Granato, Jacques Bisilliat Neto e Eduardo Rascov