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A Fundação Memorial da América Latina apresenta a 5ª etapa do ciclo de palestras intitulado “Primeiro Encontro com Pesquisadores da Literatura Latino-americana Contemporânea”, no dia 21 de novembro, segunda-feira, no auditório da Biblioteca Latino-americana Victor Civita, com entrada franca. A coordenação acadêmica é dos professores Maurício Silva, Rita Couto e Murilo Jardelino.
Desta feita, o autor em questão é o argentino Néstor Perlongher (1949 – 1992, foto acima). O pesquisador Pablo Gasparini falará sobre o tema: “No entremeio das línguas: a poesia neobarroca de Néstor Perlongher”. Gasparini é professor em Letras pela Universidad Nacional de Rosario (UNR, Argentina). Possui mestrado e doutorado em Letras (Literatura Hispano-Americana) pela Universidade de São Paulo. Fez pós-doutorado no Instituto de Estudos da Linguagem da UNICAMP. Os seus temas de pesquisa estão focados na questão do exílio (publicou "El exilio procaz: Gombrowicz por la Argentina", Beatriz Viterbo, 2007) e na problemática do deslocamento lingüístico/literário. Ministra as disciplinas sobre ensino de literaturas hispânicas da Licenciatura na Área de Espanhol da USP.
Na palestra no Memorial, Gasparini (foto ao lado) discorrerá sobre a emergência da língua portuguesa na escrita poética de Néstor Perlongher, significativa desde a radicação deste poeta e antropólogo de fala espanhola na cidade de São Paulo. O que faria um escritor castelhano aos poucos ir se deixando impregnar pelo português e introduzir o “portunhol” em sua obra? Gasparini atentará para os vínculos entre essa opção linguística e o ideário de flutuação identitária que envolve sua poética "neobarroca".
Em 2002, o professor da USP Jorge Schwartz escreveu o texto que segue, na introdução da “Homenaje a Néstor Perlongher” in “Cuadernos de Recienvenido”, publicação do Programa de Pós-Graduação em Língua Espanhola e Literaturas Espanhola e Hispano-Americana:
“No momento em que registramos os dez anos do falecimento de Néstor Perlongher (1949-1992), em São Paulo, nada mais oportuno do que esta homenagem. Ela se faz a partir da mesa-redonda realizada no auditório da Fnac-Pinheiros, em 04 de abril de 2001, que contou com a participação de Paula Siganevich, Roberto Echavarren, Nicolás Rosa, Haroldo de Campos além de Glauco Mattoso, em meio à plateia, tendo sido lançado, na ocasião, o livro do homenageado “Evita vive e outras prosas”, editado pela Iluminuras. Foram também dez os anos da permanência de Néstor nesta cidade. Presença fulgurante e polifacética, ele oscilou entre Buenos Aires e São Paulo, aqui permanecendo em uma espécie de exílio voluntário, movido por umairresistível atração pelo viés tropical, que Glauco Mattoso apelidou de “mulatitude”.
Poeta, antropólogo, militante da política homossexual, Perlongher a certa altura despertou para o misticismo da seita do Santo Daime, de origem amazônica. Orgulhoso por ter nascido no bairro bonaerense de Avellaneda, foi aqui que se concentrou o período mais fecundo de sua vida, em todos os sentidos. De um total de seis livros de poemas, só o primeiro deles, AustriaHungría, foi totalmente produzido em Buenos Aires; os demais foram lavra paulistana. Seu barroquíssimo espanhol manteve-se imutável. Ou melhor, ele foi enriquecido por suas fecundas abordagens do portunhol, sendo hoje considerado precursor nos meios lingüísticos locais. Foi também no Brasil que ele produziu seu trabalho teórico mais sólido, a lamacenta teoria do riopratense “neobarroso”, publicada em Caribe Transplatino (Iluminuras, 1991), corroborada pelo que seria seu paideuma poético: Lezama Lima, Severo Sarduy, José Kozer, Osvaldo Lamborghini, Roberto Echavarren, Arturo Carrera, Eduardo Milán e Tamara Kamenszain.
O diálogo que manteve com escritores, críticos, jornalistas, editores, antropólogos e psicanalistas brasileiros foi intenso e se deu por meio de constantes intervenções públicas, artigos, entrevistas, prólogos e traduções. Os poemas aqui reproduzidos, de Haroldo de Campos e de Glauco Mattoso, são a prova fiel dessa interlocução. Oscilando entre a produção poética e a antropológica, Néstor viveu a carreira docente na Unicamp e iniciou um doutorado na USP. Da primeira, resultou o livro “O negócio do michê”, estudo original sobre a prostituição masculina. (Difícil esquecer uma incursão urbana na noturna paulicéia, fazendo com ele uma “científica” contabilidade prostibular!)
Surpreendeu a todos nós que um aluno da pós-graduação tivesse obtido em 1992 um dos maiores e mais cobiçados reconhecimentos internacionais a seu talento poético: a Bolsa Guggenheim. Mergulhado nos cânticos, em rezas e na ayahuasca do Santo Daime, ele planejou no último ano de sua vida a produção de um “Auto Sacramental”, que, infelizmente, não terminou. Néstor transformou-se em uma das vozes líricas mais originais em língua espanhola e, nas palavras de Roberto Echavarren, “um dos poetas mais sugestivos e vigorosos a partir dos anos 80 na Argentina”. O Brasil também reconheceu seu talento, especialmente na publicação póstuma de “L a m ê” (Unicamp, 1994), cujo luxuoso projeto visual e organização interna (por Roberto Echavarren, com primorosa transcriação de Josely Vianna Baptista) teriam sido bem de seu agrado.
Sua passagem por nosso planeta foi vertiginosa e ainda custa acreditarque não mais esteja entre nós. Sua presença sempre provocava uma “inquietante estranheza”: pela agudeza e agressividade das ideias, pelas posições marcantes e, nos últimos tempos, pelos elegantes chapéu e cachecol que portava, sem falar na lucidez e dignidade com que conduziu sua doença até o fim.”
Serviço
Palestra: No entremeio das línguas: a poesia neobarroca de Néstor Perlongher
Palestrante: Pablo Gasparini
Evento: Primeiro Encontro com Pesquisadores da Literatura Latino-Americana Contemporânea” – 5ª Etapa
Data: 21 de novembro, segunda, 19h30
Local: Auditório da Biblioteca Latino-Americana.
Entrada franca (com atestados de presença). Infs: eventoscbeal@memorial.sp.gov.br / 3823-4780