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Os cineastas João Batista de Andrade e Marcelo Piñeyro foram os grandes homenageados na noite de encerramento do 5º Festival de Cinema Latinoamericano de São Paulo, nesse domingo, 18 de julho de 2010, apresentada pela jornalista Mona Dorf. Eles receberam o troféu Memorial da América Latina, que reproduz em miniatura a famosa “Mão”, criada por Oscar Niemeyer. Os filmes de ambos foram os últimos a serem exibidos no Festlatino, na Sala 1 do Memorial: primeiro, “As noivas da quinta-feira”, a mais recente película de Marcelo Piñeiro; e depois “O homem que virou suco”, de João Batista de Andrade, em cópia restaurada.
O cineasta argentino se recordou do 1º Festlatino, em 2006, quando aqui veio para apresentar seu filme “El Método”, que, posteriormente, no circuito comercial brasileiro se chamou “O que você faria?”: “Notei que o Festival cresceu muito nestes anos e agora se espalha por várias salas pela cidade. Antes era só aqui no Memorial. Foi um prazer voltar e ver como está robusto. Que siga crescendo”, acrescentou. Marcelo Piñeyro havia dado, no dia anterior, uma aclamada aula magna, quando não apenas falou sobre os pressupostos de sua criação, como também traçou um painel do cinema argentino atual, que se encontra em grande fase, com produção diversificada de diversas gerações e que tem recebido acolhida em todo o mundo.
João Batista de Andrade – que deu o pontapé inicial do Festlatino, em 2006, quando ocupava o cargo de Secretário de Cultura do Estado de São Paulo – agradeceu o troféu, mas, bem-humorado, advertiu “que essa homenagem não vai me fazer parar de filmar, não. Eu que como vocês sabem sou um cineasta prolífico vou continuar filmando. Agora, por exemplo, me preparo para adaptar para o cinema o mais importante romance dos anos 50,“Vila dos Confins”, de Mário Palmério, que trata da transição do Brasil rural para o moderno e todos os conflitos que isso gerou”. Ele se reconhece como um cineasta latinoamericano desde o começo dos anos 60, no início da sua carreira no cinema e na política. “Naquele tempo me veio um sentimento latinoamericano muito forte, porque o continente estava imerso em um lodaçal de ditaduras. No Brasil ainda não, mas havia um embate e o clima para o golpe já estava sendo construído”.
Jovens ganhadores
Também nessa noite foram conhecidos os vencedores da parte competitiva do Festlatino. A disputa entre as produções de escolas latinoamericanas de cinema foi ganha pelo curta de 26 minutos “A Maré”, do cubano Armando Capó Ramos, representando a Escola Internacional de Cinema e Televisão, localizada no município de San Antonio de los Baños, próximo à Havana, Cuba. Contado de maneira sensível, trata-se da história de um homem que, rejeitado pela sociedade, vive em um velho barco abandonado, ancorado em um lugar esquecido da baía de Santiago de Cuba. Essa aparente calma é rompida quando ele recebe uma ligação misteriosa que lhe provoca a necessidade de se relacionar com os outros. O jovem estudante de cinema cubano Capó Ramos ganhou do Festlatino uma bolsa residência de um mês em São Paulo, em 2011, à época do 6º Festlatino. Nesse período, ele participará de atividades no meio cinematográfico paulista, conhecerá cineastas de várias matizes e será um dos jurados da competição entre as escolas de cinema daquele ano.
“Quebra-cabeças” foi o filme contemporâneo do Festlatino que recebeu as melhores notas do público. O preferido pelo Júri Popular deste ano é o 1º filme de Natalia Smirnoff, embora ela já tenha atuado como produtora de importantes películas argentinas e trabalhado com Lucrecia Martel (“O pantâno”), Pablo Trapero (“Nascido e criado”) e Alejandro Agresti (“Valentin”). O filme (fotos ao lado e acima) trata da solidão de seu protagonista em meio a problemas familiares. María del Carmen, uma dona de casa de 50 anos que mora em um subúrbio de Buenos Aires, descobre que tem um dom, montar quebra-cabeças. Ela conhece Roberto, um milionário de 60 anos que sonha em participar do torneio mundial de quebra-cabeças na Alemanha. Juntos, eles conseguem formar parceiros imbatíveis de jogo. Isto traz uma enxurrada de desejos e descobertas…
0 grande ganhador do Prêmio da Crítica deste ano foi o documentário “A falta que me faz”, da jovem cineasta mineira Marília Rocha, de 32 anos. Marília faz parte do coletivo Teia e já mostrou a que veio nos aclamados “Aboio”, de 2005, e “Acácio”, de 2008l. “A falta que me faz” narra de maneira singela as contradições da passagem para a idade adulta – sonhos, romantismo, amizades, angustias, traições – de 4 adolescentes colhedoras de sempre-vivas da Serra do Espinhaço, norte de Minas Gerais. Elas moram em Curralinho, distrito de Diamantina, e se chamam Alessandra, Priscila, Shirlene e Valdênia (fotos abaixo). “Dedico esse prêmio a essas garotas”, disse Marília Rocha, “vou entregar a elas este troféu na semana que vem, quando farei a 1ª exibição em sua cidade. Muito obrigado ao júri e ao Festival por ter acolhido a minha proposta de filme”, concluiu, ao lado do cineasta e crítico Eduardo Valente, que representou o juri.
“O Festlatino vem crescendo”, confirmou Jurandir Muller, um dos curadores do Festival, “e se consolida apresentando cada vez mais filmes inéditos no Brasil”. Para Muller, o Festlatino tem uma característica principal que o torna uma espécie de barômetro do que vem por aí em matéria de cinema na América Latina. “Apresentamos novos cineastas ao público brasileiro, muitos deles fazendo o seu primeiro filme de longa-metragem, mas já bem aceitos em festivais importantes. São jovens inquietos de países centrais como Brasil, Argentina e México, mas também de lugares sem tradição cinematográfica, como Costa Rica, Porto Rico, Paraguia e Bolívia, por exemplo”.
Esta efervecência criativa detectada pelo Festlatino vem da inquietação de jovens realizadores que vão dominar a cena daqui a alguns anos. “Antigamente, o cineasta ia fazer seu primeiro longa depois dos 40 anos. Agora não mais”, explica Muller. Cedo, eles fazem bons filmes de baixo orçamento, como “A casa muda”, totalmente filmado com máquina fotográfica, ou “Estrada para Ythaca”, de um novo núcleo cinematográfico no Brasil, sediado no Ceará. Ou então trabalham em conjunto, como o Coletivo Teia.
O Festlatino está de olho nesta tendência sem desconsiderar as retrospectivas, homenagens, mostras paraleas, mesas de debates, aulas magnas e oficinas, que o carateriza desde o primeiro ano. Que venha a 6ª edição do Festival de Cinema Latinoamericano de São Paulo!
Por Eduardo Rascov
Fotos Marcos Finotti e Daniela Agostini
Fotos dos filmes: divulgação do Festlatino
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