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São Paulo, 14 de julho de 2011.
Inseridas muitas vezes em um contexto geopolítico amplo, as ditaduras latino-americanas tendem a se solidificar no asfalto da história através da frieza de números e datas. Para marcar o que já morreu na pele da atualidade, subjetivar é preciso. Em Post Mortem, o diretor e roteirista Pablo Larraín apresenta a ditadura chilena através do personagem Mario Cornejo, funcionário de um necrotério em Santiago de 1973, ano em que Salvador Allende foi deposto pelo militar Augusto Pinochet. O personagem é interpretado pelo ator Alfredo Castro, que também protagonizou o premiado Tony Manero, do mesmo diretor.
Alheio à movimentação esquerdista que precede o golpe, Cornejo está sempre dentro de seu carro, de sua casa, de si mesmo. O barulho ensurdecedor dos carros militares circulando pelas cinzas ruas de Santiago é contraposto pelo silêncio e pela luminosidade da casa do funcionário, assim como o movimento de manifestantes passa despercebido dentro de seu automóvel. Cornejo bate "literalmente" a porta na cara do sonho revolucionário.
Apenas um fator o faz escancarar as portas e sair: as finas pernas de uma dançarina de cabaré que é também sua vizinha. Apesar das constantes investidas de Cornejo, a esquelética Nancy apenas usa o funcionário para satisfazer suas necessidades materiais enquanto está verdadeiramente envolvida com um perseguido político.
Outro momento que abala a apatia de Cornejo é a instalação do regime militar, quando a carnificina invade o seu dia-a-dia. No necrotério, ele tem de transportar pilhas de corpos descarregados a todo o momento pelo exército, além de enfrentar a presença repressora dos militares.
O ápice desse desconforto se dá quando o personagem, acostumado ao registro manual, tem de enfrentar uma máquina elétrica de escrever para registrar o laudo da necropsia de Allende em frente a uma platéia do alto escalão militar. As imagens do corpo do presidente deposto impressionam e a intervenção do exército no conteúdo do laudo nos faz refletir sobre a verdadeira causa de sua morte, que voltou a ser investigada recentemente.
Em um final impactante, Larraín mostra como o afeto não correspondido aliado à pressão psicológica da ditadura sobre os anônimos podem armar um golpe tão fatal quanto os protagonizados pelos grandes nomes da história.
Post Mortem será exibido às 21h desta sexta-feira, 15, na Cinemateca e neste sábado, 16, às 21h no Memorial da América Latina. Entrada franca.
por Martina Medina, do Blog do Festival
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